sábado, 13 de junho de 2015

#5 Quando o real é visto como não natural

Texto de autoria de Simone Bittencourt Shauy em seu blog no Obvious.



Cindy Crawford, ex-top model. Um ícone do mundo da moda por décadas. Admirada por muitos, cortejada por muitos outros como símbolo da beleza feminina absoluta. Um ensaio fotográfico feito em 2013 para a revista Marie Claire mexicana que foi "vazado" antes do produto final, causou o que poderia ser chamado de considerável choque. Não porque Cindy posou de lingerie aos 48 anos de idade, mas porque a foto não havia sido ainda, nos termos em voga atuais, "fotoshopada". A obsessão pela perfeição e vaidade sem limites moldou nossa mentalidade de tal modo, que uma foto como esta poderia ser chamada por muitos um "ilogismo fotográfico", uma imagem que "agride" os olhos. Tudo porque a gente se acostumou ou foi doutrinado a ver fotos de modelos e celebridades como se seus corpos fossem sempre flawless (sem nenhuma imperfeição). No cinema, se a celebridade não tem o corpo "esperadamente" perfeito, entra em cena o dublê de corpo. Na fotografia, o dublê de corpo tornou-se o photoshop. É a maquiagem e cirurgia plástica contemporâneas, sem dor, risco de complicações ou oposição dos envolvidos. Assim, acabamos aceitando este recurso que, de exceção, tornou-se regra! Hoje em dia, quase tudo que seja natural especialmente no que diz respeito ao físico, é considerado mal gosto, ofensivo, desagradável. Deve ser escondido ou "restaurado" para "o bem" geral da pessoa e dos olhos alheios. As modelos plus-size estão tentando, à duras penas, conseguir um lugar ao sol no mundo das passarelas e revistas de moda e na aceitação popular. Mas ainda as modelos consideradas reais e ideais no mundo da moda e da beleza são as muito magras, por vezes esqueléticas. Se Cindy Crawford teve o propósito de publicar a foto sem retoques, não se sabe se este foi o caso ou não, poderia facilmente ser considerada uma revolucionária, anarquista, por estar rompendo o paradigma da beleza artificial como regra. Por mais que queiramos negar, mascarar, omitir, disfarçar, a verdade é que a influência da passagem do tempo sobre o corpo humano é inexorável para todos nós, sem exceção. Usam-se os recursos de maquiagem, photoshop e cirurgia plástica, mas o corpo invariavelmente envelhece, o colágeno vai para o espaço, se aposenta, porque tem data de validade, como tudo no nosso corpo físico. É por isto que esta obsessão pela beleza física é uma corrida com fins lucrativos muito mais para a indústria de cosméticos, cirurgiões plásticos, revistas, etc. A escravidão da beleza física nos faz negligenciar em muito a beleza interna, esta sim essencial e duradoura, a que pode saltar aos olhos muito mais a longo prazo, ser mais apaixonante que um corpo todo plastificado, impregnado de produtos, siliconado, anabolizado, modificado artificialmente de todas as formas, mas oco, se não se cultivou o conteúdo interno. Buscar a beleza física perfeita é o caminho mais fácil para a frustração definitiva. Isto leva igualmente à escravidão por aceitação, por desesperadamente querer pertencer ao clube seleto da beleza ideal criada pelos que se acham credenciados o suficiente para definir e determinar o que beleza perfeita é, os ditadores da beleza ("beauty police"). Numa entrevista, Cindy Crawford disse que preferia ter no rosto rugas de alguém que sorri muito do que rugas de dissabor. O pressuposto da beleza universal, penso eu, deveria tão e somente o de ser física, mental e psicologicamente autêntico. Beleza perfeita é a que aceita a autenticidade incondicionalmente. Vamos abolir a escravidão da perfeição para abraçar a liberdade da natural expressão, seja de que tamanho, cor, forma, sexo, idade, cultura, status social for. Esta pressão para ser perfeito pode estar destruindo a autoestima de muitas pessoas se elas não tiverem estrutura mental e emocional fortes o suficiente para não deixar isto ser o parâmetro do valor delas como pessoas. Sejamos honestos, tentar ser perfeito exige um investimento hercúleo e sem garantias de agradar gregos e troianos e muito menos resultados permanentes de excelência e contentamento ímpar. Vamos sim nos cuidar por uma questão de saúde e amor-próprio, mas não até o ponto que a insanidade nos separe!





Adaptação.
[Texto Original]

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